Tutinha Carvalho, O futuro do rádio é retrô
Por Camila Balthazar
Fotos Grazi Ventura
Fotos Grazi Ventura
Antonio Augusto Amaral de Carvalho Filho carrega um nome grande,
mas é conhecido pelo diminutivo, Tutinha. O apelido veio do pai, o Tuta,
que deixou oficialmente a presidência do Grupo Jovem Pan em junho deste
ano. O filho assumiu o posto e, com a irreverência que lhe é tão
característica, dá continuidade ao exaustivo trabalho de pensar somente
fora da caixa. Mas, antes de dizer qualquer coisa, ele foi logo
avisando: “não sou bom de entrevista”. Verdade ou não, nas duas horas
seguintes a essa afirmação, ele contou grande parte de sua história,
suas loucuras e como a empresa deve se posicionar daqui pra frente, com a
internet dominando o mundo.
Na sala do seu escritório, na Avenida Paulista, em São Paulo, Tutinha
divide espaço com um quadro tamanho gigante da icônica imagem de
Einstein com a língua para fora. Esse comportamento é o mínimo que o
presidente do Grupo Jovem Pan espera dos funcionários – e dele mesmo.
“Graças a Deus, bato bem fora da caixa!”, diz. Esse dom o acompanha
desde pequeno. Na escola, era daqueles que sentavam no “fundão”, jogava
(inofensivas) bombas pelo pátio e fazia piadas com todos. “Era o meu
jeito de sair do bullying”, explica Tutinha, apontando para a
mancha do lado esquerdo da testa. Ele era respeitado por todos,
inclusive pelos professores.
O motivo era fácil de entender: o avô, Paulo Machado de Carvalho, era
dono da TV Record desde 1953 e de diversas emissoras de rádio
paulistanas, entre as quais a Rádio Record, a Rádio Excelsior, a Rádio
São Paulo e a Rádio Panamericana AM e FM. “Eu dava ingresso dos
festivais para os professores e levava os amigos da escola ao cinema da
televisão para ver filmes que ainda não tinham estreado. Era um ídolo”,
diz. As notas continuavam baixas, mas, por trás do boletim vermelho,
estava a vontade de trabalhar. Aos 15 anos, ele já participava do dia a
dia da TV líder em audiência, com o tradicional cargo “faz tudo”: som,
câmera, luz.
Quando o pai, Antônio Augusto Amaral de Carvalho, o Tuta, adquiriu as
ações dos irmãos e tornou-se o único proprietário da Jovem Pan,
anteriormente conhecida como Rádio Panamericana, Tutinha
dedicou-se aos
bastidores da televisão. Era 1973 e ele estava com 17 anos. “Nunca
pensei em outra vida. Toda minha família era do ramo. O glamour da
televisão era o que todo moleque gostava”, lembra. A liderança na
audiência persistira pelos anos de 1960, mas, na virada da década,
problemas financeiros refletiram na busca diária pelo primeiro lugar,
levando o canal ao posto de quinto lugar no Ibope. Também nos anos 1970,
Silvio Santos articulou o golpe que o levou, às escondidas, ao controle
de 50% da emissora do avô de Tutinha.
“Lá estava eu, fazendo os programas de televisão, quando venderam
parte da emissora por motivos que não sei direito. Vim trabalhar com meu
pai no rádio”, conta. Parece até que ele nasceu com a vida feita.
Assim, sem esforço, conquistou tudo. Mas não foi bem assim. Ninguém
discorda que o empresário já chegou ao mundo com um caminho profissional
apontado, porém, como acontece em tantos outros negócios de família, o
grande desafio do herdeiro é manter a empresa lucrativa. Disso, Tutinha
entende bem. Três anos depois que entrou para a Jovem Pan, o pai
inaugurou a Jovem Pan FM, que virou sua responsabilidade em tempo
integral até o início deste ano.
“A Jovem Pan ficou mais de vinte anos em primeiro lugar. Tivemos
fases boas, outras piores, mas sempre estivemos no pódio”, pontua. Para
isso, o mantra era pensar o que ninguém pensou. “Precisa lançar projetos
criativos e fora do normal para fazer sucesso. Isso vale para todos os
setores. É difícil. Não é fácil fazer”, declara. Sempre com pitadas de
humor, Tutinha
colocou no ar programas que viraram clássicos do rádio,
como Mike Nelson, Café com Bobagem e Djalma Jorge, até hoje lembrado
pela voz anasalada e suas piadas politicamente incorretas. O segredo era
falar besteira, ser engraçado e fugir à regra. Em vez de puxar o saco
do ouvinte com presentes e elogios, o contrário imperava. “O cara ligava
e falava: ‘oi, faz seis meses que eu queria falar com você’. E
respondíamos: ‘fica mais seis meses’. Aquilo chocou, foi cool e pegou”, lembra.
Tutinha
coloca a mão na massa. Hoje, a Jovem Pan conta com 320
funcionários, sendo 80 no FM. Mas, há 30 e poucos anos, a realidade era
outra. O atual presidente tinha um cargo diferente: Bombril, como ele
mesmo define. “Eu sabia fazer tudo. Se brigava com o locutor, arrancava
ele do estúdio, pegava o microfone e falava”, afirma.
Com essa irreverência quase escrachada, nasceu o programa Pânico, em 1993, apresentado por Emílio Surita, Marcelo Baptista e Fernando Mello. A ideia surgiu durante as viagens de Tutinha para os Estados Unidos, embaladas pelo radialista Howard Stern, que tratava seus ouvintes com desprezo. O programa explodiu e virou hit, tornando-se um case de sucesso da rádio.
Com essa irreverência quase escrachada, nasceu o programa Pânico, em 1993, apresentado por Emílio Surita, Marcelo Baptista e Fernando Mello. A ideia surgiu durante as viagens de Tutinha para os Estados Unidos, embaladas pelo radialista Howard Stern, que tratava seus ouvintes com desprezo. O programa explodiu e virou hit, tornando-se um case de sucesso da rádio.
Dez anos depois, Tutinha
quis mais. Com o objetivo de repetir o
sucesso do rádio na televisão, o empresário começou a bater na porta das
principais emissoras. Os “nãos” foram unanimidade. O projeto só avançou
após um patrocínio inicial da Vivo. Com o dinheiro na mão, a Rede TV
topou abrir o espaço. “Logo que estreou, foi bem. Era tosco,
completamente diferente do que é hoje. Na época, fez o Casseta e
Planeta, que era o principal programa de humor, parecer velho. Por que
deu certo? Porque é fora da caixinha”, conta.
As cenas que iam ao ar deixavam até mesmo Tutinha arrepiado de vergonha. Entrevistar Caetano Veloso com microfone desligado era apenas um exemplo das loucuras que a equipe gravava todas as semanas. A partir de 2012, o programa migrou para a Band, alcançando novos recordes de audiência.
As cenas que iam ao ar deixavam até mesmo Tutinha arrepiado de vergonha. Entrevistar Caetano Veloso com microfone desligado era apenas um exemplo das loucuras que a equipe gravava todas as semanas. A partir de 2012, o programa migrou para a Band, alcançando novos recordes de audiência.
Em paralelo ao sucesso na televisão, a Jovem Pan se reinventa. Foi-se
o tempo em que Tutinha
estava na balada “noite sim, noite também”,
anotando as músicas que a galera mais gostava. “O sucesso da rádio
dependia muito de lançar a música primeiro. Hoje isso não existe mais.
Já está tudo no Youtube.
Desde a criação do iTunes, isso se "banalizou”,
comenta o presidente, lembrando dos tempos em que os ouvintes gravavam
suas playlists na fita cassete. Mas o clima não é de nostalgia. O
futuro da rádio já começou a ser construído com a aposta dos programas
de conteúdo. “Acredito que esse é o futuro. O rádio vai voltar para o
passado com os grandes comunicadores. O ouvinte simpatizará com o
locutor”, explica. No ar desde 2012, o programa Morning Show é um dos
melhores exemplos para esse formato, que reúne notícias, entretenimento e
humor.
“Outro desafio é a multiplataforma”, expõe Tutinha. O aplicativo da
Jovem Pan para celular tem um milhão de downloads, sendo que entre as
funcionalidades estão as rádios web com diferentes gêneros. “Se eu fiz
essa lista de músicas, qualquer um pode fazer. Por isso não acredito
mais no rádio musical”, indica. O conteúdo transita entre a rádio, a
internet e também nas redes sociais. Se o digital pode ser um pesadelo
para a televisão e os meios impressos, o rádio tem tudo para ser seu
melhor amigo. “Temos interatividade. Rádio é rápido. Recebo uma notícia
pelo aplicativo Whatsapp e já coloco no ar agora”, aponta. Para isso, Tutinha
tem investido bastante em profissionais de tecnologia.
A geração Y tem esse perfil conectado, mas sua volatilidade no
mercado de trabalho mexe com a paciência de Tutinha. “Vou implementar
uma gestão mais eficiente, baseada em Meritocracia. Paga bem quem dá
resultado”, diz. Outro projeto que deve entrar em breve são as parcerias
com boas ideias de terceiros. “Os grandes milionários do mundo são os
Nerds. Essas pessoas precisam de mídia e, por isso, vou abrir um
departamento para entrar de sócio nesses novos negócios”, diz. Aos 58
anos, Tutinha
tem gás.
É pai de duas filhas pequenas e três crescidos,
está no quarto casamento e é tão viciado no mundo online quanto os
adolescentes. “Desviciar da internet será um problema no futuro. Se vou
viajar, o hotel não precisa ter cama nem frigobar, mas vou logo
perguntando se tem internet. É um vício. Os psicólogos vão ganhar muito
dinheiro”, enfatiza. Se forem nerds e fizerem consultas pelo rádio, o
sucesso é garantido.
Fonte: AviancaEmRevista
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